Fernanda Montenegro, inspiração na arte e na vida, é eleita imortal da ABL

A atriz e intelectual, Fernanda Montenegro,foi eleita imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL). Aos 92 anos, ela será a primeira mulher a assumir a cadeira 17 e sucederá o diplomata Affonso Arinos de Melo Franco (1930-2020). Esta cadeira foi ocupada pelo escritor Sílvio Romero, o poeta Osório Duque-Estrada, o antropólogo Roquette-Pinto, o crítico literário Álvaro Lins e o filólogo Antonio Houaiss.
A ícone da dramaturgia, Fernanda Montenegro, recebeu 32 votos dos 34 eleitores. Dois votos foram em branco. Fernanda num gesto de gentileza e de elegância,em 2018, declinou de concorrer à vaga para não competir com o amigo Ignácio de Loyola Brandão.
A agora, acolhida pela “poesia da imortalidade”, como ela já declarou, aguarda data em março de 2022, quando acaba o recesso da ABL, para assumir a cadeira. A ABL a consagrou como “sensível leitora do real”, nos registros oficiais divulgados para a imprensa. Ao Museu da Imagem e do Som carioca coube o registro nas redes sociais: “Imortal, como deve ser”.

O presidente da ABL, Marco Lucchesi, disse que a presença da atriz enriquece a academia. “Fernanda Montenegro é um dos grandes ícones da cultura brasileira. Intelectual engajada e sensível leitora do real. Sua presença enriquece os laços profundos da Academia com as artes cênicas”.
No cinema, na TV e no teatro, Fernanda é uma das grandes referências nacionais, com mais de 70 anos de carreira. A longevidade da atuação da atriz inspira gerações no mundo das artes cênicas. Em 2018 brindou os fãs com a obra “Fernanda Montenegro: Itinerário fotobiográfico” e em 2019 com “Prólogo, ato, epílogo”, livro de memórias que fala sobre a trajetória pessoal, profissional e compartilha as próprias visões a respeito do Brasil.
Como figura pública, defendeu fortemente a campanha da vacinação contra o novo coronavírus e agregou tanta popularidade, que foi convidada a estrelar comercial de instituição bancária.
Fernanda Montenegro começou a brilhar no Teatro dos Sete e Teatro Brasileiro de Comédia. Protagonizou encenações exitosas, desde os anos de 1950, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. A partir daí tornou a “dama do teatro”.

A respeitada figura humana tem trajetória inigualável nas artes cênicas, desde as passagens pela TV Rio e TV Excelsior, sem contar a projeção na Rede Globo, na qual foi consagrada em obras como Guerra dos sexos e Babilônia (polêmica obra do novelista Gilberto Braga). Para além dos palcos em que teve colaborações com o dramaturgo Augusto Boal, e os atores Sérgio Britto e Fernando Torres, Fernanda encenou de Samuel Beckett a Shakespeare.
Atriz de destaque, em espetáculos como The flash and the crash days, sob direção de Gerald Thomas) e quando encenou Nossa Senhora, na adaptação de O auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. Foi a única atriz brasileira a concorrer ao Oscar, principal prêmio da indústria do cinema norte-americano, pela atuação no filme Central do Brasil, de 1998.
O ingresso na ABL vem coroar a lenda viva, a mulher digna que orgulha todas nós mulheres. Muitos vivas à sua vida, sua história e seu legado para a cultura brasileira.

Ao longo de 124 anos de história da Academia Brasileira de Letras (20 de julho de 1897), Fernanda é a nona mulher eleita para a ABL. Antes dela vestiram o fardão de ramos de café bordados com fios de ouro e tornaram-se imortais:
Rachel de Queiroz (1977)
Dinah Silveira de Queiroz (1980)
Lygia Fagundes Telles (1985)
Nélida Piñon (1989)
Zélia Gattai (2001)
Ana Maria Machado (2003)
Cleonice Berardinelli (2009)
Rosiska Darcy de Oliveira (2013)
A doutora em sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e autora da tese “Fardos e Fardões: Mulheres na Academia Brasileira de Letras” (1897-2003), Michele Asmar Fanini, diz que tornar-se ‘imortal’ correspondia a uma prerrogativa exclusivamente masculina, até 1976. “Historicamente, as candidaturas femininas foram não só reiteradamente condenadas e rejeitadas pela esmagadora maioria dos membros da academia, como sua proibição foi incorporada ao regimento interno da ABL em 1951”.

A ABL sempre vira notícia quando um de seus membros morre e a cadeira que ocupava torna-se alvo da cobiça de aspirantes a “imortais”. Atualmente outras quatro cadeiras são disputadas por 22 candidatos, desde cantor e advogado até médico, economista e representante indígena.

Segundo o artigo 2º do estatuto da ABL, “só podem ser membros efetivos da Academia os brasileiros que tenham, em qualquer dos gêneros de literatura, publicado obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário”. Para ser candidato, duas condições são essenciais: ser brasileiro e ter escrito pelo menos um livro.
Como a ABL é uma confraria ingressar não é nada fácil. Muitos tentaram e não conseguiram. Como não há “divórcio” na academia a escolha recai em quem tem equilíbrio de saberes e a possibilidade de um convívio ameno.
Muitos sonharam em tomar o tradicional chá das quintas-feiras, com direito a bolo, suspiros e biscoitos, entre outros quitutes saborosos, enquanto as histórias de vida são compartilhadas.

No dia 11 deste mês, será escolhido o sucessor do jornalista Murilo Melo Filho (1928-2020). São três os pretendentes à cadeira 20: Gilberto Gil, Salgado Maranhão e Ricardo Daudt.
No dia 18, a disputa será pela cadeira 12, que pertenceu ao crítico literário Alfredo Bosi (1936-2021). Mais três candidatos: Paulo Niemeyer, Joaquim Branco e Daniel Munduruku.
No dia 25, seis candidatos disputam a cadeira 39 deixada pelo advogado Marco Maciel, ex-vice-presidente da República (1940-2021). São eles: José Paulo Cavalcanti, Ricardo Cavaliere, Godofredo de Oliveira Neto, Luiz Coronel, Camilo Martins e Leandro Gouveia.
No dia 16 de dezembro dez nomes disputam a cadeira 2 deixada pelo filósofo Tarcísio Padilha (1928-2021). São eles: Sérgio Bermudes, Gabriel Chalita, Eduardo Giannetti da Fonseca, Sâmia Macedo, Antônio Hélio da Silva, José Humberto da Silva, Eloi Angelos Ghio D’Aracosia, Jeff Thomas, José William Vavruk e Joana Rodrigues Alexandre Figueiredo.
Em dezembro a eleição é para escolher o próximo presidente da ABL. O nome mais cotado para substituir Lucchesi (no cargo desde 2018) é o do jornalista Merval Pereira. O ocupante da cadeira 31, se confirmado, será o 47º presidente da ABL. Quem ocupou o cargo por mais tempo foi Austregésilo de Athayde (1898-1993): 34 anos.
Fotos: Divulgação e Reprodução