Disparidade salarial entre homens e mulheres é real até no Futebol mundial

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A disparidade salarial entre homens e mulheres continua muito viva e forte até no futebol mundial. O esporte é uma manifestação cultural na qual se estabelecem relações sociais. Mesmo com a popularidade do esporte feminino em crescimento e do enorme progresso obtido nos últimos anos, a luta por respeito e equidade, é constante.

Essa desigualdade salarial entre homens e mulheres é uma realidade que assombra praticamente todos os países do mundo. A diferença salarial baseada no gênero é um dos mais importantes indicadores estatísticos da situação econômica das mulheres.

A história recente do futebol feminino se confunde com a luta pela igualdade salarial e de tratamento. Contudo, não há explicação única para a permanência das desigualdades salariais entre os sexos, assim como não há medida única para combatê-las, mas um conjunto de ações e iniciativas que envolvem tanto as instituições quanto a sociedade.

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Julie Blakstad, Catherine Joan Bott e Leicester City, durante primeira rodada da Copa do Mundo Feminina 2023 da FIFA na Austrália

Copa do Mundo Feminina 2023 trás, além da competição nos estádios da Austrália e da Nova Zelândia, uma série de comparações e discussões envolvendo o futebol feminino e o masculino. A disparidade entre o que as jogadoras recebem em comparação com seus colegas do sexo masculino é real.

Marta e Neymar, as principais referências da Seleção Brasileira em seus respectivos gêneros, simbolizam a real disparidade salarial.

Marta, 37 anos, é vencedora de seis prêmios de melhor jogadora do mundo e considerada por muitos a maior de todos os tempos recebe cerca de 400 mil dólares (R$ 1,95 milhões) por ano no Orlando Pride, dos Estados Unidos.

Segundo o jornal Marca, da Espanha, o valor, que agrega uma fortuna estimada em 13 milhões de dólares (R$ 63 milhões), no entanto, é muito aquém do que recebe Neymar no PSG, mal chegando a 1% do valor recebido pelo camisa 10 na França.

Segundo o “Le’Equipe”, o brasileiro ganha 36 milhões de euros (R$ 192 milhões) por temporada. Em comparação, o valor recebido por Marta representa 1,01% do recebido por Neymar.

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Marta, a maior artilheira da história das copas do mundo e seis vezes eleita a melhor do mundo ganha 1% do valor recebido por Neymar

Apesar de Marta ter maior número de prêmios entre os dois e ter batido vários recordes no futebol mundial, a remuneração de Neymar segue sendo muito maior.

O incrível é que o suor para estar em competições nacionais e internacionais de alto nível é o mesmo para homens e mulheres. E também porque o melhor jogador que já existiu na América Latina e no mundo é jogadora e se chama Marta. Ela é a maior artilheira da história das copas do mundo, com quinze gols, contra doze do Pelé.

Mais desconsideração com o futebol feminino: a premiação da campeã da Copa do Mundo Feminina será 10 vezes menor que o recebido pela Argentina na Copa do Mundo no Catar. A seleção que for campeã da Copa do Mundo Feminina de 2023 receberá, da Fifa, uma premiação de 4,29 milhões de dólares (R$ 20,6 milhões).

O valor é cerca de 10 vezes menor do que o concedido à Argentina, que venceu a última Copa do Mundo, em 2022, no Catar. Na ocasião, a AFA (Associação de Futebol Argentino) recebeu 42 milhões de dólares (R$ 201,54 na cotação atual).

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Argentina: campeã da Copa do Mundo 2022

A disparidade salarial entre homens e mulheres é normalmente referida em termos monetários, medindo quanto as mulheres ganham para cada dólar que um homem ganha. Mas para os jogadores, a igualdade de remuneração abrange mais do que simplesmente fechar essa lacuna em relação aos salários dos jogadores de futebol masculino.

O salário dos jogadores de futebol é composto por muitos elementos diferentes: salários do clube, taxas de jogo ao representar a seleção, premiação em dinheiro e patrocínio. Como tal, a igualdade de remuneração pode tornar-se nebulosa.

Segundo a Forbes, enquanto Megan Rapinoe e Alex Morgan, dos EUA, e Sam Kerr, da Austrália, foram as jogadoras de futebol mais bem pagas no ano passado, ganhando US$ 5,7 milhões cada uma, dentro e fora do campo, seu colega masculino mais bem-sucedido, Cristiano Ronaldo, estava ganhando US$ 136 milhões com receitas dentro e fora do campo.

Mas os próprios ganhos multimilionários estimados de Morgan e Rapinoe são um valor discrepante até mesmo nos escalões mais altos do esporte.

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Seleção dos Estados Unidos: campeã da Copa do Mundo Feminina de 2019

Embora os salários dos principais jogadores em países como os EUA e a França tenham uma média de quase US$ 250 mil por ano, os salários variam muito entre os países e podem ser inferiores a US$ 600 por mês, ou mesmo se ainda existir um salário, de acordo com um relatório de 2020 do sindicato de jogadores globais FIFPRO.

“É inaceitável receber uma remuneração escassa ou pobre, porque essas jogadoras de futebol, que são as melhores de seu país, dedicam horas, semanas, meses e anos de seu tempo para representar sua seleção no mais alto nível”, disse Jonas Baer-Hoffmann, secretário-geral da FIFPRO, à CNN.

Levantamento feito pela CNN mostra que a igualdade de prêmios em dinheiro nas Copas do Mundo masculina e feminina ainda está longe.

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Marta, vencedora de seis prêmios de melhor jogadora do mundo, a maior artilheira da história das copas do mundo e considerada por muitos a maior de todos os tempos

A Copa do Mundo Feminina é uma importante fonte de renda para as jogadoras. Mas muitas que estão competindo precisaram de outros empregos para se sustentar.

Um relatório da FIFPRO divulgado em junho constatou que dois terços das jogadoras pesquisadas relataram ter que tirar licença não remunerada de outro emprego para jogar por sua seleção nacional em torneios de qualificação para a Copa do Mundo, como a CONCACAF W Championship ou a Women’s Africa Cup of Nations.

De acordo com um Relatório de Benchmarking da FIFA de 2022, quase um quarto (23%) dos 225 clubes em 25 ligas nacionais têm principalmente jogadoras amadoras, enquanto o restante trabalha com uma mistura de profissionais – que têm um contrato oficial com o clube e recebem mais do que suas despesas incorridas – e amadoras. Mais da metade (53%) das federações pesquisadas ainda não têm regulamentação sobre o salário mínimo das jogadoras.

A decisão da FIFA de introduzir prêmios individuais em dinheiro este ano ocorreu depois que mais de 150 jogadoras de 25 seleções nacionais, apoiadas por seu sindicato global FIFPRO, enviaram uma carta ao órgão regulador do futebol em outubro passado pedindo igualdade de condições e prêmios em dinheiro.

“Muitas jogadoras do Mundial Feminino chegam ao torneio como amadoras ou semiprofissionais, o que prejudica a sua preparação e, por sua vez, a qualidade do futebol que vemos em campo”, disse a FIFPRO na carta enviada a Infantino em outubro de 2022, acrescentando que muitas jogadoras também não tinham acordo com as suas federações-membro para garantir uma compensação garantida no Mundial.

Levantamento feito pela CNN mostra que a igualdade de prêmios em dinheiro nas Copas do Mundo masculina e feminina ainda está longe.

Baer-Hoffmann disse à CNN que a garantia do prêmio em dinheiro às jogadoras era “um passo importante para dar a mais delas independência financeira e capacidade de se concentrar em se tornar o melhor que podem ser”, mas também pediu às federações nacionais que dessem a suas jogadoras “muito mais apoio financeiro” nos anos intermediários entre cada Copa do Mundo.

A decisão da FIFA de reservar parte do dinheiro da Copa do Mundo Feminina para as jogadoras, representa um “grande marco”, mas ainda não é a “linha de chegada”.

Apesar de todas as barreiras práticas à igualdade de gênero no futebol, são as “atitudes sexistas” e “mudar as barreiras de atitude que são as mais difíceis”, disse a ex-diretora executiva do Women’s Soccer Australia, Heather Reid. Tais atitudes estão profundamente arraigadas.

Ainda hoje, a maioria dos tomadores de decisão no futebol continuam sendo homens – o comitê executivo da UEFA tem 20 membros, 19 dos quais são homens, enquanto o Conselho da FIFA tem 37 membros, 30 dos quais são homens. Todas, exceto uma das mulheres sentadas nesses órgãos de tomada de decisão, preenchem as cotas de assentos, reservadas especificamente para mulheres.

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Lucy Bronze, treinadora da seleção inglesa para a Copa do Mundo Feminina 2023

Essa tradição precisa mudar. De acordo com o Relatório de Benchmarking da FIFA de 2022, 74% dos treinadores principais em todas as ligas de futebol feminino ainda são homens, sem nenhuma mulher em cargos de liderança na Alemanha, Islândia, Holanda e Noruega.

No Brasil a CBF escolheu a sueca Pia Sundhage para técnica da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de futebol feminino. Ela estará entre os dias 20 de julho e 20 de agosto em dois países-sede: Austrália e Nova Zelândia, no comando das brasileiras. Pia Sundhage virou treinadora da Seleção Brasileira em 2019 e comandou a seleção durante todo aquele ciclo da Copa. A seleção, sob seu comando, fez uma campanha invicta na Copa América – seis vitórias em seis jogos –, coroada com o oitavo título no torneio organizado pela Conmebol. 

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Pia Sundhage treinadora da Seleção Brasileira de Futebol Feminino

Estudos mostram que a segregação é componente fundamental para a interpretação das diferenças salariais e que o objetivo da igualdade está em valorizar e remunerar igualmente mulheres e homens, independentemente do lugar que ocupam no mercado de trabalho ou da função que desempenham.

Fotos: Naomi Baker – The FA/The FA via Getty Images e Reprodução