Eleições 2018: o pleito mais complexo dos últimos tempos

Eleições 2018

Em outubro, os eleitores brasileiros vão às urnas decidir os próximos governantes a nível estadual e federal para os poderes Legislativo (deputados e senadores) e Executivo (presidente da República e governadores).

Para além dos desafios já conhecidos de um processo eleitoral dessa magnitude, é notável que o pleito de 2018 tende a ser o mais complexo já visto em nosso país. Vários elementos contribuem para este cenário: fake news, polarização dos eleitores, influência das redes sociais, bolhas digitais e robôs, entre outros.

Neste texto, sem a menor pretensão de encerrar o assunto, mas com o objetivo de lançar luz aos fatos, se passa a tratar dos desafios a serem enfrentados.

Fake news

O ato de espalhar notícias falsas não é novo. A novidade está em seu alcance e impacto social. Há mais de 300 anos a sabedoria geral alerta que “uma mentira dá meia volta ao mundo antes que a verdade tenha tempo de calçar os sapatos”. O que já era verdadeiro na época, é ainda mais real na atualidade, na qual a velocidade de disseminação de uma mentira quebra recordes a cada dia.

Em um terreno em que grande parte da população se informa através de redes sociais, como WhatsApp, Facebook e Instagram, e o compartilhamento das publicações é quase que instantâneo, a mentira lançada por determinados grupos se espalha com grande facilidade. E, como se sabe, uma mentira costuma ser confundida com a verdade quando contada repetidas vezes.

O exemplo estadunidense é bastante pertinente ao tema em questão. Nas eleições de 2016 para a presidência dos Estados Unidos viu-se duas faces das fakes news: defesa e ataque. Donald Trump, então candidato, passou a alegar que toda e qualquer notícia desfavorável aos seus interesses é fake news (argumento de defesa). Por outro lado, de modo oportunamente contraditório, disseminou inúmeras informações falsas sobre seus oponentes políticos, como na vez em que acusou Obama e Hillary de serem “cofundadores” do Estado Islâmico (estratégia de ataque promovendo a desinformação dos eleitores).

Diante das fake news, um sem-número de eleitores corre o risco de votar (ou deixar de votar) em algum candidato por influência de informações falsas, o que é catastrófico para um processo democrático de tamanha relevância.

Polarização do debate político

Coxinha versus petralha é o novo Fla-Flu da nação brasileira. A grande diferença é que no primeiro não há vencedores, pois, o país perde como um todo.

A polarização do debate político é algo que se acentuou demasiadamente nos últimos anos, sobretudo a partir das eleições de 2014, onde Dilma e Aécio disputaram o cargo mais alto do Executivo.

O cenário narrado é trágico para a democracia. A administração da coisa pública, nos interesses dos cidadãos, depende do debate e da participação de todos. Ocorre que a polarização do debate político tem substituído a discussão de ideias e propostas por rótulos e preconceitos.

A máxima de que “a virtude está no meio” (Aristóteles) parece ter sido esquecida. Nas conversas cotidianas, logo surgem os referidos rótulos, de modo que é cada vez menor a possibilidade de haver um debate com maior profundidade sobre os temas de relevância nacional.

Redes sociais, robôs, memes e bolhas digitais

Tanto as fakes news quanto a polarização do debate político ganham ainda mais força no ambiente das redes sociais, o que se deve, entre outros fatores, ao funcionamento das plataformas (Instagram, WhatsApp, Facebook, etc), que favorece o surgimento das bolhas digitais, bem como ao comportamento dos usuários nas redes.

Redes sociais, sites de busca, como o Google, e até mesmo sites de notícias, como The New York Times e The Washington Post, lançam mão de algoritmos que direcionam as publicações que chegarão aos internautas, criando um mundo próprio dentro da internet. Com isso, aquilo que a pessoa curte, comenta ou compartilha com frequência é o que aparecerá em sua timeline reiteradamente, de modo que as tendências da pessoa são reforçadas com o tempo. É como se o internauta fosse um telespectador, mas o controle remoto estivesse nas mãos da rede social, que definisse o que ele vai assistir com base em suas escolhas pretéritas.

A consequência imediata é a criação de aprisionantes bolhas digitais, onde pessoas com os mesmos gostos e opiniões se relacionam, com a exclusão do que é diferente. Outra consequência é a diminuição do espaço de debate, uma vez que os internautas já não são mais confrontados com pontos de vista opostos e notícias não tão favoráveis às ideias que defende.

Existe uma relação direta de proporcionalidade entre extremismo e popularidade: quanto mais sensacionalista for a “notícia” ou a opinião, maior tende a ser a sua divulgação nas redes sociais. Assim, o fake news se alastra na timeline das pessoas, ganhando ainda mais espaço nas bolhas digitais, acarretando um desserviço à informação pública e se tornando uma grave ameaça à democracia.

Há, ainda, outros fatores expressivos nesse cenário. Muitos candidatos lançam mão de robôs digitais que manipulam a opinião pública nas redes sociais. De acordo com estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV)[1]:

Com este tipo de manipulação, os robôs criam a falsa sensação de amplo apoio político a certa proposta, ideia ou figura pública, modificam o rumo de políticas públicas, interferem no mercado de ações, disseminam rumores, notícias falsas e teorias conspiratórias, geram desinformação e poluição de conteúdo, além de atrair usuários para links maliciosos que roubam dados pessoais, entre outros riscos.

Nesse contexto, é comum o internauta desatento travar fervorosos debates políticos com contas automatizadas (robôs) pensando se tratar de pessoas reais.

Somam-se a essa preocupante conjuntura certos comportamentos dos usuários das redes sociais que são prejudiciais à democracia. Hoje, as discussões são cada vez mais rasas e pautadas no achismo. Como alerta reiteradamente o professor Leandro Karnal, basta a pessoa criar uma conta no Facebook para que ela pense ser especialista em todos os assuntos. Além disso, os usuários tendem a compartilhar posts sem checar a sua veracidade e se comunicam por memes e outros meios que não favorecem o debate.

Por todos os fatores narrados, o pleito deste ano será um dos mais complexos da história brasileira, envolvendo tecnologias recentes, eleitores desinformados e candidaturas mal-intencionadas, em um ambiente onde o debate político sério é quase inexistente.

 

Por Gilbert Di Angellis

Gilbert Di Angellis


[1] FGV. ROBÔS, REDES SOCIAIS E POLÍTICA: ESTUDO DA FGV/DAPP APONTA INTERFERÊNCIAS ILEGÍTIMAS NO DEBATE PÚBLICO NA WEB. Disponível em <http://dapp.fgv.br/robos-redes-sociais-e-politica-estudo-da-fgvdapp-aponta-interferencias-ilegitimas-no-debate-publico-na-web/&gt;. Acesso em 26/08/2018.