30 Anos de Democracia e liberdade de pensamento
“Declaro promulgado o documento da liberdade, da democracia e da justiça social do Brasil”, disse o então presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, no dia 05 de Outubro de 1988.
Tudo começou quando o presidente José Sarney convocou a Assembleia Nacional Constituinte com a participação de 487 deputados e 72 senadores. Foram 20 meses de debates intensos para o país finalmente conquistar a democracia depois de 21 anos de ditadura militar e a sociedade passou a ter sua liberdade de pensamento assegurada. Eu tive a honra de acompanhar tudo de perto.

Hoje, 5 de outubro de 2018, a Constituição Federal completa 30 anos, como um dos principais símbolos da democratização do país. A Constituição Cidadã, como foi chamada, é responsável por assegurar os direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e o direito livre à manifestação. Fortaleceu a fiscalização e o controle das contas públicas, o combate à corrupção, ampliou os poderes dos tribunais, e norteou políticas públicas em áreas sociais como o SUS e a Previdência Social.

Para comemorar os 30 anos de democracia e liberdade de pensamento, o Supremo Tribunal Federal realizou na tarde de ontem sessão solene conduzida pelo presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, o presidente da República, Michel Temer, todos os ministros da Corte, ministros aposentados do STF, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, e a ministra-chefe da Advocacia-Geral da União, Grace Mendonça.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, rechaçou ditadura, fascismo, nazismo, comunismo, racismo e discriminação durante sessão especial do tribunal comemorativa dos 30 anos da Constituição Federal. Toffoli parafraseou o jurista José Gomes Canotilho, segundo o qual “é função primária de uma Constituição cidadã fazer ecoar os gritos do nunca mais”. “Nunca mais, nunca mais a escravatura, nunca mais a ditadura, nunca mais o fascismo e o nazismo, nunca mais o comunismo, nunca mais o racismo, nunca mais a discriminação”, afirmou.
Para Toffoli, nenhum outro ator institucional é mais “efetivo” que o próprio cidadão, “aquele que se destina o fim e ao cabo essa Constituição”. “É essa percepção que deve conduzir seu intérprete na constante evolução de sua aplicação, de modo a assegurar que as conquistas até aqui obtidas sempre vigorem, não admitindo involuções, especialmente quanto à democracia estabelecida, à cidadania conquistada e à pluralidade até aqui construída.”
Segundo o presidente do STF, a Constituição de 1988 garantiu ao Judiciário a autonomia e a independência. “Não fosse por isso, o Judiciário e esta Corte Suprema não disporiam dos instrumentos para promover e manter a paz na sociedade brasileira, quer entre as pessoas, quer entre as instituições.” “Os desafios existem e sempre existirão, como disse em meu discurso de posse nesta Corte, o jogo democrático traz incertezas, a grandeza de uma nação é exatamente se inserir neste jogo democrático e ter a coragem de viver a democracia”, declarou Dias Toffoli.
O ministro Marco Aurélio Mello disse que nenhuma Constituição é obra acabada. A legitimidade depende da crença e do empenho das instituições e da sociedade, e não apenas da qualidade do texto e do arranjo político institucional estabelecido. “E da firmeza de propósito de como se compreende, interpreta e observa a lei maior”, afirmou. Para o ministro, “incumbe ressaltar o papel de intérprete guardião que o Supremo desempenha”, sem “menosprezar, com isso, a participação dos poderes Legislativo e Executivo”.
Marco Aurélio Mello ressaltou a centralidade dos direitos fundamentais da Constituição e a missão do STF. “Os direitos fundamentais são a parte mais importante do projeto constitucional de 1988, envolvidos os valores liberdade, igualdade e dignidade. A concretização desses direitos tem sido a principal missão do Supremo”, afirmou o ministro Marco Aurélio.
A Procuradoria-Geral da República, Raquel Dodge, afirmou que a Constituição é visionária na sua proteção dos direitos humanos e que expressa a vontade do povo como em nenhuma outra ocasião. O povo viu-se reconhecido, e anseios de dignidade foram acolhidos. Expectativas de respeito à intimidade pessoal foram atendidas.
O presidente da República, Michel Temer, relembrou que há 30 anos, “depois de muito trabalho e esforço, foi promulgada a Constituição Federal. Tive a honra e o privilégio de servir como constituinte naquele momento da História”.
O presidente da OAB, Claudio Lamachia, em nome da advocacia brasileira cumprimentou o STF na pessoa na pessoa de seu presidente, ministro Dias Toffoli, pela justa, oportuna e necessária celebração. “O Brasil vive um dos períodos mais turbulentos, controversos e complexos de toda a sua história republicana”. Lamachia destacou que “a travessia é turbulenta, problemática, mas pode conduzir a um cenário de futuro promissor, em que o Estado, como queriam os gregos do Século de Péricles, seja a expressão efetiva da cidadania. Isso, porém, só é possível dentro da lei, em que a Constituição seja a bússola. Não há outro caminho”.
A Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, chega nesta sexta aos 30 anos em um momento pouco propício a comemorações. Em meio à grave crise econômica e política que se instalou no Brasil, não faltam propostas dos candidatos a Presidência da República para substituí-la.
Recebeu nestes 30 anos 99 emendas e outras 1.475 estão em debate no Congresso. É bom lembrar os ensinamentos do ministro aposentado do STF, Ayres Britto, que para alterar qualquer dispositivo da Carta Magna, é necessário um quórum elevado: três quintos dos parlamentares em cada uma das Casas Legislativas, com intervalo nas votações, entre os dois turnos. A alteração na CF depende de 308 votos favoráveis na Câmara dos Deputados e 49 no Senado. Na Assembleia Constituinte, para aprovação de dispositivos era necessária a aprovação de metade mais um dos constituintes.
Desde que foi promulgada em 1988, este é o primeiro ano em que não ocorrem modificações no texto constitucional em virtude da intervenção federal na segurança pública no Rio de Janeiro. A Carta Magna estabelece que seu texto não pode sofrer emendas durante a vigência de intervenção federal, de Estado de Defesa ou de Estado de sítio.
Até agosto, a intervenção suspendeu a tramitação de 536 Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) no Senado. Dessas propostas, 82 estavam prontas para votação. Já na Câmara, 625 emendas aguardam análises de mudanças constitucionais.